O Colégio do Caraça, em Catas Altas-MG, foi tombado por sua importância cultural.
IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
Nome atribuído: Colégio do Caraça: conjunto arquitetônico e paisagístico
Localização: Catas Altas-MG
Número do Processo: 407-T-1949
Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico: Inscr. nº 15-A, de 27/01/1955
Livro do Tombo Histórico: Inscr. nº 309, de 27/01/1955
Descrição: O conjunto arquitetônico e artístico do Caraça tem suas origens ligadas à ação devocional praticada na Capitania de Minas no século XVIII, marcada pela intensa atuação dos devotos leigos, especialmente através das irmandades e confrarias, e das iniciativas individualizadas de alguns eremitas. Estes foram fundadores de importantes comunidades religiosas em Minas, como o Recolhimento de Macaúbas, o Santuário Bom Jesus de Matozinhos de Congonhas, a ermida de Nossa Senhora da Piedade e o próprio Santuário do Caraça.
O fundador do Caraça foi um português de origem nebulosa, Irmão Lourenço de Nossa Senhora, segundo ele mesmo se denominou. Versões ainda não totalmente comprovadas o ligam ao atentado a D.José I de Portugal, do qual seria um dos executores, tendo fugido para a colônia brasileira sem jamais revelar seu verdadeiro nome e origem. Após permanecer alguns anos no arraial do Tejuco, hoje Diamantina, onde teve estadia comprovada documentalmente, iniciou sua obra eremítica já na Serra do Caraça, fundando a Irmandade de Nossa Senhora Mãe dos Homens. A licença para arrecadação de esmolas e a provisão para ereção da capela datam de 1774, quando são iniciadas as obras, também dirigidas para a edificação do “hospício”, ou seja, a hospedagem destinada aos companheiros eremitas e peregrinos.
Entre os anos de 1774 e 1779, é construído o núcleo original do conjunto, composto pela capela e as alas laterais em dois pavimentos, com seis janelas em cada andar. Obras de ornamentação e outros melhoramentos tiveram continuidade nos anos seguintes, como atesta documento de 1783, onde o Irmão Lourenço se refere a pinturas na capela-mor e obras no corpo da mesma capela. Diversos documentos revelam com detalhes as condições materiais do Santuário, em especial o seu patrimônio, nos primeiros anos do século XIX.
Um deles é o inventário das alfaias e bens patrimoniais da capela, realizado em 1805 por iniciativa do próprio Irmão Lourenço, para constar em seu testamento. Segundo o mesmo, já naquele ano, a capela encontrava-se devidamente decorada, mobiliada e paramentada para o culto, dispondo no altar-mor as imagens de seus padroeiros – Nossa Senhora Mãe dos Homens e São Francisco – e outros santos: nos sete altares dos corredores laterais as imagens da Paixão de Cristo e o corpo de São Pio Mártir, adquirida pelo Irmão Lourenço, em 1792, por concessão da Santa Sé, e considerada a grande riqueza espiritual do Santuário. No documento encontra-se também a descrição das demais dependências do conjunto, como as alas de hospedagem (dois sobrados de pedra, cada um com dez quartos), refeitório (uma construção separada), relação do mobiliário, ferramentas, animais, escravos, terras e culturas.
Em relatório do ouvidor Antônio Luiz Pereira da Cunha, de 1806, são citados outros elementos, como os dois púlpitos e o coro da capela, o piano forte e um “pequeno órgão”. Todos estes bens foram doados pelo Irmão Lourenço a D. João VI em seu testamento de 1806, sob a condição que ali se estabelecesse uma missão religiosa ou um seminário, objetivo maior perseguido pelo fundador do Caraça desde o começo de sua obra.
Embora já mostrando os primeiros sinais de esvaziamento da casa, datam de 1801 novas reformas e melhorias no conjunto, em especial os trabalhos de pintura e douramento realizados por Manoel da Costa Athaíde nos altares e púlpitos da capela. Nos anos seguintes, alguns viajantes estrangeiros visitaram o Santuário, como Spix e Martius, e Saint-Hilaire, relatando em seus livros pormenores da riqueza natural do sítio e do seu conjunto arquitetônico. São também testemunhas do seu crescente esvaziamento e da decadência física e espiritual do Irmão Lourenço.
Após a sua morte, em 1819, todo o patrimônio, embora dilapidado pela ação de seu administrador e tutor, passou às mãos do Príncipe Regente D. João VI. Em 1820, chegaram finalmente ao Caraça os primeiros missionários, os lazaristas portugueses da Congregação da Missão, enviados para realizar a obra educativa sonhada pelo seu fundador. Já no ano seguinte, os padres Leandro Rebello Peixoto e Antônio Ferreira Viçoso fundaram o colégio, inaugurando a fase portuguesa da administração (1820-1842), que a princípio teve grandes dificuldades financeiras devido à estagnação do estabelecimento. Com apoio oficial, consubstanciado no título imperial conferido pelo Imperador D. Pedro I, o Caraça se tornaria um grande centro de formação educacional da província, ampliando suas instalações para abrigar um número crescente de alunos.
Nos últimos anos da década de 20, foi executado um acréscimo na ala esquerda do edifício, somando mais cinco janelas às seis já existentes. O acervo artístico também foi significativamente valorizado com a encomenda e aquisição da tela pintada por Manuel da Costa Athaíde, representando a Santa Ceia, e o retrato do Irmão Lourenço, executado e doado pelo mesmo artista.
A “revolução de 1842” levou à transferência do colégio para Campo Belo, permanecendo as instalações em estado de quase abandono, atendendo a poucos peregrinos e irmãos que visitavam o local. A partir de 1854 passou a abrigar o Seminário de Mariana. O colégio retorna ao Caraça em 1856, agora sob a administração dos padre lazaristas franceses. Tornou-se um sólido estabelecimento de ensino, dentro dos métodos jesuíticos, de forte tendência humanista. Alcançou nesse período grande prestígio institucional, influindo na formação de grande parte da elite política e eclesiástica mineira e mesmo nacional: este êxito estendeu-se às primeiras décadas do século XX, confirmado pela sua extensa lista de ex-alunos de renome.
Para corresponder a esta expansão institucional, o complexo edificado teve significativo crescimento espacial na segunda metade do século XIX. Neste período foi construída a maior parte das edificações no Caraça, como as diversas alas nos fundos do prédio principal e realizadas melhorias como nas estradas de acesso ao Santuário. A tentativa de se erguer um novo prédio para acomodações de seminaristas entre 1863 e 1866 – o chamado Cenáculo – compreendendo um sobrado e uma capela distante duzentos metros do complexo original, foi mal recebida pela comunidade, resultando nas ruínas que existem até hoje no “Alto da Carapuça”.
A maior intensidade construtiva ocorreu durante a administração do padre francês Júlio Clavelin, também arquiteto e engenheiro. Este superior elaborou um projeto para a totalidade do conjunto, visando a sua expansão de maneira harmoniosa mas significativa, visto o crescente número de seminaristas e colegiais que afluíam ao estabelecimento neste período.
Numa Litogravura datada presumivelmente de 1870, é possível identificar o projeto do padre Clavelin como foi concebido originalmente. Outros documentos administrativos e iconográficos revelam, entretanto, o que foi efetivamente executado: o acréscimo da ala direita, na exata proporção do aumento empreendido pelo Pe. Leandro, ou seja, mais cinco janelas, destinado ao seminário interno (entre os anos de 1860/1870): o prédio posterior, destinado aos alunos, do qual se construiu apenas a primeira parte (entre 1871/1876); a igreja neogótica, edificada entre 1876 e 1883, em substituição à capela barroca original. Esta nova ermida, dedicada à Nossa Senhora Mãe dos Homens, é um dos primeiros exemplares da arquitetura neogótica no Brasil. Guardado este pioneirismo, sua edificação comprometeu definitivamente o acervo colonial do Santuário ao demolir inteiramente a graciosa capela erguida pelo Irmão Lourenço, cujo interior já não comportava o grande número de alunos e religiosos que a freqüentavam.
Produto do espírito de modernidade então vigente, a nova igreja foi construída com recursos próprios da Congregação e esmolas. Erguida em granito, com cobertura em ardósia, o projeto buscou reunir os estilemas próprios do neogótico, em especial no seu programa decorativo, como no uso de vitrais, encomendados na França pelo Padre Clavelin em 1884. Sem comprometer sua unidade estilística, no interior do templo foram também dispostos dois altares barrocos, decorados por Athaíde, e o diversificado acervo em imaginária e relíquias, fruto dos distintos momentos construtivos do mesmo. Caberia ao sucessor do Pe. Clavelin, Pe. Luís Gonzaga Boavida, a complementação dos trabalhos, como a segunda parte do prédio destinado aos alunos, a colocação dos vitrais na capela e outros trabalhos importantes, como a construção da barragem do Tanque Grande. Também foi o Pe. Gonzaga o responsável pela montagem e execução de diversas peças do órgão existente na capela.
Na segunda metade do século XIX, recebeu o Caraça muitos alunos e visitantes ilustres, que deixaram diferentes registros, textuais e iconográficos, fundamentais para sua história. De especial interesse são os desenhos e pinturas de Thomaz Driendl (interior da igreja, 1879) e George Grimm (paisagem do Caraça, 1885).
O processo de esvaziamento do Colégio Caraça, em decorrência da epidemia de beriberi e do surgimento das escolas laicas nos centros urbanos, acentua-se ao longo das primeiras décadas do século XX. A nova mentalidade laicizante, decorrente do processo político da proclamação da república, determinou a diminuição dos alunos, forçando a comunidade da Congregação da Missão a voltar-se mais especialmente para a formação sacerdotal, embora mantendo o colégio ainda por um longo período. O amplo programa construtivo projetado pelo Pe. Clavelin foi definitivamente abandonado, e os trabalhos restringiram-se à manutenção das edificações existentes e melhorias técnicas.
Em maio de 1868, um violento incêndio concorreria para o definitivo abandono do ensino leigo no Caraça. Neste incêndio, o prédio construído pelos padres Clavelin e Boavida viria a ser inteiramente destruído, inclusive sua biblioteca, onde se perdeu mais da metade do seu acervo, então com 30.000 volumes, em parte composta por obras dos séculos XVII e XVIII. Com o fechamento do Colégio, o estabelecimento restringiu as suas atividades educacionais à formação de padres para a Congregação e fortaleceu a sua primitiva vocação para o acolhimento de visitantes, leigos ou religiosos, recolhimento ou encontros religiosos e culturais.
A partir do final dos anos setenta, iniciaram-se as gestões no sentido de promover a restauração do conjunto edificado, envolvendo autoridades do Estado e da Congregação e os órgãos de preservação federal e estadual – IPHAN e IEPHA/MG. Buscando recursos na iniciativa privada, em 1984, foi firmado convênio entre a Província Brasileira da Congregação da Missão, o IEPHA/MG e a Companhia Vale do Rio Doce, resultando na restauração da ala direita lateral à capela, chamada “bloco de hospedagem”, inaugurada em 1989. Novo convênio, realizado com o BDMG- Cultural, permitiu a restauração das ruínas do antigo prédio incendiado, que recebeu novo agenciamento, adequando-se para o desenvolvimento de atividades como museu, biblioteca e centro de convenções. O projeto foi contratado pela Fundação Roberto Marinho, sendo de autoria do arquiteto Rodrigo Meniconi.
Inaugurado em agosto de 1990, constitui-se hoje num marco nos trabalhos de restauro no Brasil, caracterizado especialmente pela introdução de novos materiais ao lado das paredes arruinadas e consolidadas, permitindo a leitura dos distintos momentos construtivos do prédio. Com a Constituição mineira de 1989, novo aparato jurídico foi acionado na defesa do Santuário, agora no sentido da preservação do seu acervo natural: a serra do Caraça foi tombada e declarada monumento natural do Estado de Minas Gerais.
Texto extraído de: Inventário Nacional de Bens Móveis e Integrados VITAE/ IPHAN.
Fonte: Iphan.
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